Raciocínio 46/200
Como ter potência criadora - 2 estratégia: O que é um não assunto (continuação): na prática o que deixar de fazer (parte 4/4)

Hoje vamos analisar o nosso Raciocínio 46/200 - Como ter potência criadora - 2 estratégia: O que é um não assunto (continuação): na prática o que deixar de fazer (parte 4/4)

Temos vindo a analisar aquilo que chamamos de "não assuntos"(1). De forma clara e específica para nos fazermos entender rapidamente - há um conflito, e aquele assunto morre naquele momento.(2)

Na verdade o que irá acontecer, é que no momento que partilhamos(3) aquilo que chamamos de não assunto(4), estamos a dar palco a que ele exista.(5)

A ideia agora é passar da análise das consequências de um não assunto(6) para uma prática concreta: o que deixar de fazer, para que o não assunto não seja promovido a assunto?(7)

Em vez de regras precisamos de gestos práticos de desapego(8), coisas tão simples como não repetir(9), não colecionar(10), não dramatizar.(11)

Na prática, o que deixar de fazer para que o não assunto não cresça?(12)
É preciso perceber que se trata mais de omitir gestos(13) do que de acrescentar(14). Não é ação, é des-ação(15). É não dar palco(16). É deixar morrer no silêncio fértil(17). Não repetir a ninguém o que aconteceu(18). A tentação de contar outra vez(19), de "só comentar"(20), é a primeira armadilha.(21)

Cada vez que a cena é narrada(22), ela ganha raízes(23). O treino é resistir à repetição do que aconteceu(24). Não guardar memórias como provas(25), colecionar pequenas injustiças(26), fazer arquivos mentais(27) para depois usar(28). Tudo isso é como pôr água numa erva daninha(29). Deixar de colecionar é deixar que seque sozinha.(30)

Deste modo não podemos enfeitar a lembrança(31), não lhe dar mais brilho do que tem(32). O conflito, quando recontado(33), veste-se de importância(34) e ocupa espaço vital.(35)

- Não levar para dentro de casa,(36)
- Não levar para os amigos,(37)
- Não levar para o trabalho.(38)

Cada vez que se partilha(39), multiplica-se(40). A leveza nasce quando se deixa ir(41). Não podemos ceder ao rumor(42). Quando o não assunto já circula nos corredores(43), a prática é não lhe dar eco(44). Um rumor precisa sempre de alguém que o transporte(45); se não passar por nós, morre ali.(46)

No fundo, deixar de partilhar é um ato de ternura(47). É escolher não dar corpo(48) ao que não merece corpo(49), não dar voz(50) ao que não merece voz(51). Assim, a energia vital fica guardada para aquilo que importa(52): o riso, a criação, o amor.(53)

A graça nisto tudo é que "o não assunto", para nós, tornou-se mesmo assunto(54), mas não no sentido pesado(55), apenas no sentido fértil(56), de descoberta(57), do esclarecimento(58) que precisamos demonstrar para que fique explicado:(59)

1. O que é um não assunto?(60)
2. As consequências de um não assunto(61)
3. E a nível prático o que fazer?(62)

A conclusão é simples e paradoxal:(63)
O não assunto morre no momento em que não lhe damos palco.(64)

E no instante em que falhamos e tornamos um não assunto em assunto(65), é precisamente quando alimentamos(66) aquilo de que se fala.(67)

O verdadeiro treino está em perceber que a vida é feita de escolhas de foco(68). Quando escolhemos não repetir(69), não espalhar(70), não colecionar(71), damos ao conflito a única resposta que o desarma(72): a indiferença amorosa.(73)

No amor, no trabalho, em qualquer relação, o não assunto não é esquecimento nem repressão: é grandeza de carácter.(74)

É a capacidade de deixar morrer(75) o que não merece vida(76), para que o espaço íntimo(77) permaneça fresco(78), leve e habitável(79). E a nossa grandeza está em deixá-los morrer ali mesmo(80), para que o que importa viva sem sombra.(81)

O Centro sou eu, deixemos os outros nos seus não assuntos(82)
Sendo assim queremos concluir este raciocínio ainda com mais força, porque ficaremos centrados onde tudo começa e acaba: em nós.(83)

O desfecho é claro: não estamos interessados em saber o que os outros fazem com os não assuntos(84). Não queremos vigiar(85), nem corrigir(86), nem salvar ninguém desse enredo.(87)

A única mudança que importa é a nossa(88). É em nós que o não assunto morre(89). É na nossa escolha de não repetir, não narrar, não colecionar, que o ciclo se quebra(90). É na nossa consciência que a erva daninha deixa de ter água e seca por si(91). Não há responsabilidade de policiar o mundo(92). Há apenas o pacto íntimo de cultivar leveza dentro de nós(93). Porque quando em nós o não assunto não ganha palco(94), em nós nasce espaço para a ternura, para o amor ao próximo e para a criação.(95)

Tudo o resto são ecos que não nos pertencem, nem nos interessam.(96)

O essencial é este gesto silencioso e secreto(97): deixar morrer em nós o que não merece vida.(98)

"Em mim nasce a criação, a ternura, o investimento do meu tempo, no amor, na construção das vidas".(99)

É uma conclusão que respira(100), que não fecha portas(101), nem aprisiona(102), mas coloca o foco naquilo que queremos cultivar.(103)

- quero cultivar o amor,(104)
- quero cultivar a ternura,(105)
- quero cultivar a criação,(106)
- quero investir o meu tempo na construção das vidas.(107)

Por isso o não assunto morre em mim!(108)

Abraço fraterno
Nuno Miguel R. S. Gomes
(Sociólogo e Filósofo)

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